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Solilóquio: Quando foi que eu me tornei isso que eu sou hoje?

Foto do escritor: Algum LucasAlgum Lucas

Disponível em vídeo, pelo Youtube. Quando foi que eu me tornei isso que eu sou hoje?


É engraçado pensar em mim mesmo e perceber que não me imagino como sou, muito menos como tento ser. Penso sempre naquele menininho ligeiro que tentava se divertir apesar dos tédios da vida, imaginando aventuras e grandiosos combates no chão da sala.


Pensei recentemente em escrever sobre desrespeito e sobre como muitas vezes o tratamento desrespeitoso - cotidiano, devo adicionar - das pessoas ao nosso redor me dá nos nervos. Odeio as "sugestões amigáveis" e os "no seu lugar, eu..." que sempre vêm à tona na vida de quem se propõe a fazer algo diferente, especialmente de quem se mete com arte.


Hoje, tenho estabilidade, emprego e um mínimo de respeito. Mas, se dissesse: "acho que vou apostar no youtube", instantaneamente começariam os "acho que você não deve largar tudo e...". Mas quem falou em largar tudo? Essas presunções que fazem sem me dar o benefício da dúvida me revoltam. São das poucas atitudes que verdadeiramente me ofendem.


Portanto, apostei sem nunca dizer uma palavra. Simplesmente comecei a fazer, de maneira consciente.


Se isso que me tornei tem uma característica definitiva, é justamente essa retidão, essa inflexibilidade que me impulsiona e move sempre e mais adiante. Eu jamais "largaria tudo" assim, sem mais nem menos. Isso seria coisa de garoto. E talvez aí resida a ofensa: não só a falta de respeito do outro, mas essa falta de retidão interna.


Retidão a que preço? É isso mesmo que me tornei? Um homem inflexível, obcecado e, apesar de gentil com o outro, tirano comigo mesmo? Será que isso não é perder um pouco a linha até mesmo na ideia do estoicismo? Sêneca curtia várias festas antes de fazer a famosa refeição de pão e água pra reequilibrar os sentidos.


Nessas jornadas existenciais de cada dia, sempre me impressiono com os prazeres levianos daqueles que só curtem a vida. E julgo. Julgo como quem acha que sabe o que é melhor pra todos. Garoto. A verdade é que essas duas versões que me habitam disputam o meu respeito, e nessa dicotomia externalizante, me anulo.


Dizer que "são essas versões que brigam entre si" é muito diferente de aceitar que sou eu mesmo quem não consegue lidar com o que me tornei. E aí, e somente aí, jaz a resposta à pergunta: quero me tornar quem penso ser, ou ser aquele capaz de ir até o fim com aquilo que é precioso pra mim?


São duas vias opostas. Aquele que é, o é sempre na mesma medida em que permanece insuficiente. Aquele que faz, faz da insuficiência o caminho para o tornar-se-alguma-outra-coisa.


Devém.


E eu então já não sou mais aquele que disse: "Quando foi que eu me tornei isso que eu sou hoje?"



19-02-24 12:59


Um solilóquio escrito num intervalo de almoço, antes de bater o ponto no trabalho.

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